Por Thiago
Romero
Agência FAPESP – Fumantes tendem a ser mais extrovertidos,
característica que se relaciona com outras, como sociabilidade,
afetuosidade, espontaneidade e facilidade de comunicação. Por outro
lado, quando comparados com ex-fumantes e não fumantes, eles se
mostram mais propensos a serem mais ansiosos, tensos e impulsivos.
Essas características, por sua vez, do ponto de vista psicológico,
têm forte relação com transtornos mentais como esquizofrenia e
depressão.
Esse diagnóstico foi descrito em estudo realizado na Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo
(USP), que acaba de ser publicado no Jornal Brasileiro de
Pneumologia. O trabalho apresenta uma revisão da literatura
científica sobre a psicologia do tabagismo, a fim de eleger
características da personalidade consideradas como obstáculos ao
abandono do tabagismo.
Segundo os autores, a justificativa do estudo, cujos resultados
tiveram como base a análise de dados de mais de 60 trabalhos de
grupos de pesquisa nacionais e estrangeiros, é que a compreensão dos
fatores de natureza psicológica associados ao consumo de cigarros
pode contribuir para a criação de novas estratégias terapêuticas
para o tratamento da dependência.
“Os programas de intervenção-padrão que têm como foco a terapia
cognitivo comportamental, como por exemplo os indicados pelo Inca
[Instituto Nacional de Câncer], basicamente vão orientar uma
diminuição progressiva do uso do cigarro e uma maior atenção ao
ambiente controlador, que são as situações do cotidiano que
estimulam o consumo, seja após um cafezinho ou no happy hour
com os amigos em um bar”, disse à Agência FAPESP o
coordenador do trabalho, Ricardo Gorayeb, professor do Departamento
de Neurologia, Psiquiatria e Psicologia Médica da FMRP.
“Conhecendo a personalidade dos usuários, após um atendimento
individual, ou com base em dados de literatura, o terapeuta pode
direcionar um aconselhamento clínico específico para cada
indivíduo”, apontou Gorayeb, indicando que, apesar de a prevalência
de consumo variar de continente para continente, a literatura indica
que hoje, em média, 20% da população mundial é tabagista.
Seguindo essa linha de raciocínio, para aumentar o número de
pacientes que de fato abandonarão o tabaco no fim do tratamento, o
pesquisador aponta ser fundamental, antes de iniciá-lo, que a
personalidade dos indivíduos e a presença de algum distúrbio
psiquiátrico sejam cuidadosamente avaliadas pelos profissionais de
saúde.
“Muitos casos no Hospital das Clínicas da FMRP, em que os
pacientes eram ansiosos ou tinham depressão, foram solucionados com
programas paralelos de relaxamento muscular e com o uso de
medicamentos antidepressivos concomitantemente ao programa. Essa
avaliação prévia deve ser feita para evitar a síndrome de
abstinência”, explicou.
Motivação grande, resultados
modestos
De acordo com o estudo feito na FMRP, apesar de a literatura
mostrar que cerca de 70% dos fumantes afirmam querer parar de fumar,
poucos conseguem: a maior parte precisa de cinco a sete tentativas
antes de definitivamente largar o cigarro.
“Em outro trabalho, que conduzi nos Estados Unidos com um grupo
de fumantes atendidos no Hospital John Hopkins, 35% dos pacientes
deixaram de fumar no primeiro ano de tratamento. Esse índice de
sucesso cai para cerca de 20% no segundo ano”, afirmou Gorayeb.
Isso ocorre, segundo ele, entre diversos outros motivos, pela tão
conhecida síndrome de abstinência causada pela falta da nicotina,
uma das principais, se não a maior, causas da manutenção do vício.
De acordo com a literatura, seus sintomas variam em intensidade
entre os usuários e se iniciam dentro de algumas horas após a
interrupção, atingindo o auge no terceiro dia sem o cigarro.
“Esse desconforto piora ao anoitecer e as maiores queixas se
referem à compulsão aumentada, à irritabilidade e à dificuldade de
concentração. Tais alterações podem ser observadas por 30 dias ou
mais, mas os sintomas de compulsão podem durar muitos meses ou
anos”, aponta o artigo publicado.
Outro fator que dificulta o abandono é o ganho de peso, uma vez
que estudos clínicos e epidemiológicos consultados pelos
pesquisadores relatam que, normalmente, os fumantes pesam menos que
os não fumantes e ganham peso quando param de fumar. O trabalho da
FMRP aponta ainda a maior prevalência de tabagismo em pacientes
portadores de transtornos psiquiátricos, em comparação com a
população em geral.
“A hipótese é que a nicotina interfere no funcionamento dos
sistemas neurotransmissores e exerce ações neuroendócrinas no
organismo humano, o que pode influenciar no quadro psicopatológico
dos usuários”, explica.
O trabalho foi realizado em parceria com Regina de Cássia
Rondina, professora da Faculdade de Ciências da Saúde da Associação
Cultural e Educacional de Garça (ACEG), e Clóvis Botelho, da
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Para ler o artigo Características psicológicas associadas ao
comportamento de fumar tabaco, disponível na biblioteca on-line
SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui