O proprietário, fumador passivo há 18
anos, considera-o o seu paraíso
Um café onde o
vício do tabaco tem de ficar à porta
Já chegou a ser ponderado o levantamento da proibição,
em nome de um maior rendimento do negócio, mas imperou o compromisso
já estabelecido com os clientes. Os fumadores têm que matar o vício
na rua.
A sinalética é tão discreta que são poucos os que
nela reparam e só depois de puxarem pelo cigarro é que dão conta que
naquele bar é proibido fumar. O proprietário da Cafetaria Kiss,
mesmo em frente à estação ferroviária do Entroncamento, decidiu
arriscar e aplicar já a legislação antitabagista que o Governo quer
ver implementada a partir de Janeiro do próximo ano. “Sei que é um
risco mas é para o bem da saúde de todos”, diz Pedro David, um jovem
que há 18 anos é fumador passivo. Jornalista na Rádio Comercial e na
TVI e DJ em várias discotecas, Pedro David vive praticamente todo o
dia rodeado do fumo dos cigarros. O café que abriu há apenas três
semanas é o seu “paraíso”.
O seu e o de alguns clientes, fidelizados exactamente
pelo facto de poderem beber uma bica ou comerem um croiassant livres
de fumo. Ganham-se uns, perdem-se outros. “Acredito que poderia ter
mais clientes se não houvesse esta proibição”, refere o jovem, dando
exemplos de pessoas que só não estão mais tempo no bar – e
consequentemente não fazem maior consumo – porque o vício do cigarro
fala mais alto.
A situação já levou Pedro David a vacilar duas vezes
e a pensar retirar a proibição mas o bom senso falou mais alto. “É
uma questão de princípio e de compromisso para com aqueles que não
fumam”, diz quem se decidiu abrir um bar para não fumadores depois
de todos os dias sair do café onde bebia a bica matinal na companhia
do filho, ainda criança, com o cheiro do tabaco impregnado nas
roupas.
Sávio Moraes, funcionário da cafetaria Kiss, conta
algumas situações caricatas. Como a de um grupo de trabalhadores da
CP que costuma ali beber a bica.”Só um deles não fuma. É o que entra
primeiro e pede os cafés, enquanto os outros acabam o cigarro lá
fora”, refere. Há ainda um cliente fumador que costuma sentar-se
numa das três mesas altas do café e folhear o jornal do dia. Um
hábito que interrompe para fumar o cigarrinho da praxe. “Deixa o
jornal aberto e pede para não deixar ninguém mexer nele enquanto vai
matar o vício”.
O funcionário diz nunca ter tido qualquer problema
com clientes por causa dos cigarros. “Alguns são mais renitentes mas
acabam por concordar com o princípio, por uma questão de boa
educação”. Pedro David aposta na diferenciação – também nunca serve
água da torneira – e na qualidade do atendimento para fidelizar
clientes. E espera não ter de desistir do princípio do não fumador
para manter a casa aberta. “Os fumadores são bem vindos, têm é de
perceber que o vício, aqui, fica à porta”.
Por: Margarida
Cabeleira
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