| Semanário | Edição n.º 413, de 7/9 a 13/9
ENTREVISTA
“Num país civilizado a Lei do Tabaco seria um problema de fácil resolução”
O presidente da delegação regional da Fundação Portuguesa de Cardiologia considera que a maioria na Assembleia da República cedeu ao lobbie dos restaurantes
CARMEN VIEIRA

Na opinião de Almada Cardoso, poderia ter-se ido mais longe nesta matéria. “Na Espanha e na Irlanda está em vigor uma lei mais restritiva e séria, mas isso não impediu as pessoas de continuar a frequentar os bares e restaurantes”, constata.

Tribuna – Um assunto que voltou à ordem do dia foi o da morte súbita dos atletas de alta competição, situação que faz alguma confusão tendo em conta que os desportistas são vistos como um exemplo a seguir no que diz respeito aos hábitos de vida saudáveis. Como se explicam estes casos?

Almada Cardoso – São situações quase impossíveis de prever. Estamos a falar de doenças muito raras: nem a miocardiopatia hipertrófica nem a displasia arritmogénica do ventrículo direito podem ser detectadas através do electrocardiograma.

Há exames que a lei obriga a fazer, mas as ressonâncias magnéticas – que são mais eficazes no diagnóstico destas doenças – são impossíveis de fazer em todos os atletas. A alta competição desportiva é um esforço muito grande para um coração que já é doente, porque não há mortes súbitas em corações que não sejam doentes.

Tribuna – Tendo em conta o efeito negativo do consumo de tabaco nas doenças cardiovasculares, como vê as alterações feitas na nova Lei do Tabaco?

AC – Poderia ter-se ido mais longe. Tal como acontece na Espanha e na Irlanda, por exemplo, os donos dos restaurantes e bares onde se fuma deviam ser responsabilizados por isso. Mas nesta lei a multa é aplicada à pessoa que fuma e não ao espaço, ao contrário do que acontece no caso da venda de bebidas alcoólicas.

Na Espanha e na Irlanda está em vigor uma lei mais restritiva e séria, mas isso não impediu as pessoas de continuar a frequentar os bares e restaurantes nem fez com que se tornassem povos mais tristes. Dizer que os estabelecimentos não podem ser multados é uma fantasia por parte do governo que, mais uma vez, cedeu ao lobbie dos restaurantes.

Uma em cada três crianças portuguesas tem excesso de peso

Isto revela que este é um país no qual a lei é uma grande aldrabice. A Fundação Portuguesa de Cardiologia foi solicitada a ir à Assembleia da República falar a propósito deste assunto, mas as nossas recomendações não foram ouvidas pelos deputados da maioria.

Lembro-me de o eng. Macário Correia, quando foi secretário de Estado do Ambiente, ter sido alvo de uma campanha de ridicularização por parte das companhias tabaqueiras através dos meios de comunicação social após ter defendido uma lei mais severa. Desta vez nem isso foi preciso, bastou convencer os deputados da maioria na AR. Num país civilizado este seria um problema de fácil resolução.

Tribuna – Relativamente à obesidade infantil, parece-lhe que se trata de um problema com dimensões preocupantes na Madeira?

AC – A esse respeito, tem sido feito um esforço muito grande por parte das secretarias da Educação e dos Assuntos Sociais, com os chamados buffets saudáveis nas cantinas escolares, para ver se conseguimos ter uma geração mais saudável.

Tribuna – E esse esforço já apresenta resultados?

AC – É um outro estudo que é preciso fazer. Sabe-se que ao nível de Portugal continental uma em cada três crianças tem excesso de peso. Aqui não sabemos qual é a situação.
Bienal de Cardiologia em Setembro
O Hotel CS Madeira Atlântico Resort acolhe entre os próximos dias 13 a 15 a I Bienal de Cardiologia da Madeira. O objectivo do encontro, segundo Almada Cardoso, é “retomar as reuniões que já foram feitas no passado, com a dra. Isabel Mendonça e o dr. Martim Diniz”: “No fundo faremos uma revisão e actualização dos conhecimentos nas áreas mais vastas da cardiologia, para o qual contaremos também com médicos do continente e dos Açores.”

Na iniciativa serão analisados temas como Avanços na Insuficiência Cardíaca Congestiva, Hipertensão Arterial Pulmonar: Da Detecção ao Tratamento, Como Diminuir o Risco de Morte Súbita, Como melhorar o Prognóstico da Doença Hipertensiva, Como Diagnosticar e Tratar as Causas de HTA Secundária, etc.

Paralelamente, será promovido o “Simpósio Científico da Delegação Regional da Fundação Portuguesa de Cardiologia”, que terá entrada livre para o público em geral. No mesmo, serão discutidos os hábitos de vida saudáveis, os avanços na reabilitação cardíaca, o estudo de factores de risco cardiovascular na Madeira, entre outros temas.
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